O Brasil poderia muito bem ocupar, no tocante à língua portuguesa, o mesmo papel que ocupam os Estados Unidos no tocante ao inglês. Existe uma Commonwealth, comunidade internacional de países de língua inglesa, da qual os Estados Unidos não fazem parte. Apesar disso, o inglês que impera no mundo é o inglês americano, por razões mais do que óbvias, sem dar a mínima bola para a política linguística do Reino Unido, que também é forte. O Brasil, no entanto, assume uma postura colonizada, de subserviência às decisões linguísticas de Portugal. Por exemplo, os livros didáticos brasileiros continuam estampando até hoje uma norma-padrão abissalmente distante do verdadeiro português brasileiro urbano culto. A ridícula proibição de começar frase com pronome oblíquo só existe porque os portugueses não falam assim. Resultado: 192 milhões de pessoas são obrigadas a seguir uma regra que é natural, espontânea, intuitiva para meros 9 milhões e meio que vivem do outro lado do Atlântico. Ninguém precisa proibir os portugueses de começar frase com pronome oblíquo: a fonologia da língua deles não permite isso, ao contrário da nossa.
O futuro do português no mundo depende do Brasil, mas para isso é necessário empreender pelo menos duas ações bem planejadas e executadas: abandonar a ideia jurássica de que só os portugueses falam bem a língua e reconhecer a legitimidade das opções genuinamente brasileiras de uso da língua, que é tão nossa quanto dos portugueses e até mesmo, se levarmos em conta a população, muito mais nossa do que deles!
Por Marcos Bagno - Línguista, escritor e professor da UNB
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